A legislação brasileira prevê a incidência de imposto de renda nas obrigações alimentares.
Nesse sentido, o filho que recebe pensão alimentícia precisa declarar mensalmente (via Carnê Leão) e anualmente (IRPF) o recebimento da pensão alimentícia, ressalvada esta obrigatoriedade na hipótese do contribuinte se enquadrar nos quesitos para conseguir a isenção de Imposto de Renda.
Esse modelo de declaração mensal é feito por meio do Carnê Leão. Carnê-Leão é um sistema de recolhimento mensal obrigatório de imposto sobre a renda de pessoas físicas, residentes no Brasil, que receberam rendimentos de outra pessoa física ou do exterior (Mais informações clique aqui).
Portanto, se o valor da pensão alimentícia for maior que a base de cálculo que prevê a isenção da alíquota, o representante legal do dependente deve recolher o imposto mensalmente através do carnê leão, segundo previsto na legislação.
Em 2022, por exemplo, a base de cálculo corresponde a R$ 1.903,98. Logo, se o filho recebe pensão alimentícia superior a R$ 1.903,98, obrigatoriamente ele precisa realizar o recolhimento da tributação por meio do Carnê Leão.
Deixar de recolher devidamente a tributação, pode resultar em sanção administrativa, judicial na área cível e, eventualmente, até mesmo penal.
Ocorre que este tipo de recolhimento foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal.
Isso porque o STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria de votos em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade movida pelo IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família) para afastar a referida tributação.
O STF firmou entendimento no sentido de afastar a incidência do imposto de renda sobre valores decorrentes do direito de família percebidos pelos alimentados a título de alimentos ou de pensões alimentícias.
E esse entendimento se pauta no argumento que o devedor da pensão (que é o alimentante) já teve esse rendimento tributado ao receber seus vencimentos, portanto, não se mostra razoável que o credor (alimentando) também seja obrigado a pagar tributos sobre a pensão alimentícia que recebeu.
No caso, existe a prática da bitributação, que é vedada pela Constituição Federal.
De posse do entendimento fixado pelo STF, algumas pessoas já ajuizaram requerendo que a União Federal seja condenada a devolver a quantia recolhida indevidamente relativamente aos últimos 5 anos (por conta do prazo prescricional), com correção monetária e juros.
E já estão colhendo os frutos desta decisão.
O juiz da 7ª Vara Cível Federal de São Paulo, vinculado ao Tribunal Federal Regional da 3º Região, julgou procedente uma ação que requeria a condenação da União Federal ao pagamento de R$ 987.394,39, por conta do recolhimento indevido relativo aos últimos 5 anos.
No caso, sustenta a autora da ação haver sido casada com o genitor de seus filhos até 2008, tendo sido acordado, entre os termos da separação, o pagamento de pensão alimentícia para ela e os filhos pelo ex-marido.
Ela relatou haver sido beneficiária de pensão alimentícia até setembro de 2017, tendo sido a mantida a prestação, após algumas ações revisionais, apenas para ambos os filhos.
Ela ainda aduz haver três execuções fiscais ajuizadas em seu desfavor em razão de suposto não recolhimento de Imposto de Renda incidente sobre as pensões alimentícias mencionadas.
O juiz, na sua fundamentação, trouxe a baila um trecho do voto do Ministro Relator Dias Toffoli.
Alimentos ou pensão alimentícia oriunda do direito de família não são renda nem provento de qualquer natureza do credor dos alimentos, mas simplesmente montantes retirados dos rendimentos (acréscimos patrimoniais) recebidos pelo alimentante para serem dados ao alimentado. Nesse sentido, para o último, o recebimento de valores a título de alimentos ou de pensão alimentícia representa tão somente uma entrada de valores. Afora isso, é certo que a legislação impugnada provoca a ocorrência de bis in idem camuflado e sem justificação legítima, violando, assim, o texto constitucional. Isso porque o recebimento de renda ou de provento de qualquer natureza pelo alimentante, de onde ele retira a parcela a ser paga ao credor dos alimentos, já configura, por si só, fato gerador do imposto de renda. Desse modo, submeter os valores recebidos pelo alimentado a título de alimentos ou de pensão alimentícia ao imposto de renda representa nova incidência do mesmo tributo sobre a mesma realidade, isto é, sobre aquela parcela que integrou o recebimento de renda ou de proventos de qualquer natureza pelo alimentante. Essa situação não ocorre com outros contribuintes.
E concluiu que diante do julgamento que declarou inconstitucional a incidência de imposto de renda nas obrigações alimentares, mister se faz reconhecer o direito dos autores à restituição dos valores indevidamente recolhidos a título de imposto de renda, observada a prescrição quinquenal disposta no artigo 168, I, do Código Tributário Nacional.
Por se tratar de uma matéria que envolve a União Federal, toda decisão de mérito (sentença) do juiz de primeiro grau passa por um reexame pelo Tribunal independentemente de recurso, ou seja, a sentença precisa ser confirmada pelo Tribunal para que passe a ter efeito entre as partes.
Em outubro/2022 o STF proferiu nova decisão reconhecendo a inaplicabilidade da modulação dos efeitos, ou seja, todos os contribuintes (alimentandos) que pagaram imposto de renda por conta de terem recebido pensão alimentícia em valor superior ao mínimo não tributado terão direito de requerer judicialmente a devolução da quantia paga indevidamente, observado o prazo prescricional.
Trecho da decisão:
Requer a União que sejam modulados os efeitos do acórdão embargado, estabelecendo-se que tenha ele eficácia ex nunc (...) Em meu modo de ver, as alegações da embargante (e os interesses e valores subjacentes a elas), são insuficientes para se acolher o pedido de modulação dos efeitos da decisão (...) Com efeito, a tributação reconhecida como inconstitucional feria direitos fundamentais e, ainda, atingia interesses de pessoas vulneráveis. Basta se atentar para o fato de que um dos fundamentos da pensão alimentícia ou dos alimentos é a dignidade da pessoa humana e o de que um de seus pressupostos é a necessidade do sujeito que a reclama. Certamente os valores devidos a tais pessoas, as quais não têm sustento próprio (ou, como disse o Ministro Roberto Barroso, não encontram “meios, ao menos imediatos, para atender às suas necessidades mais elementares”), a título de repetição de indébito são extremamente importantes para elas. Trata-se de recursos “a mais” que terão para custear suas próprias necessidade mais básicas. Para além disso, note-se, costumeiramente, que há, nesse grupo de pessoas atingidas com a tributação inconstitucional, as que necessitam de tutela especial, como são as crianças e os adolescentes, os jovens, os idosos, as pessoas com deficiência etc. (...) Em suma, ponderando os valores e interesses em conflito, não acolho o pedido de modulação dos efeitos da decisão. (...)
Nesse sentido, aquela decisão proferida pelo juiz do TRF, antes mesmo do STF se pronunciar sobre a modulação dos efeitos, tende a ser ratificada pelo Tribunal.
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